Com ilustrações e cenários feitos à mão, GRIS é um jogo de plataforma tão reflexivo quanto belo. Desenvolvido pelo estúdio espanhol Nomada Studio e distribuído pela Devolver, o título foi lançado em dezembro de 2018 com tradução integral para português brasileiro.
Em frente a uma gigantesca estátua feminina, Gris tenta cantar sem sucesso. Toda vez que o jogador aperta o botão com o qual a protagonista cantaria, a voz falha e a jovem suspira profundamente. É essa ausência de palavras que define a jornada, numa busca para superar a dor e reencontrar a si mesma.
As mecânicas do jogo são simples: a princípio é possível andar e pular, sendo que outras habilidades vão sendo desbloqueadas com o passar das fases. Além de longas caminhadas pelos cenários lindíssimos, os níveis são compostos por puzzles simples e elementos de plataforma – uma das mecânicas mais presentes é a de coletar estrelas em determinados trechos e reuni-las para abrir passagens antes inacessíveis.
São as fases do luto que nomeiam cada capítulo, fornecendo uma pista importante sobre a temática que norteia a trama: negação, raiva, negociação, depressão e aceitação. Esses temas são reforçados de forma brilhante pela paleta de cores dominante no cenário e também por elementos que o compõem. Para o momento da depressão, por exemplo, é a cor azul que impera, com monumentos melancólicos reforçando a atmosfera criada.
As habilidades que a protagonista ganha também são intimamente ligadas ao desenvolvimento da história. É sempre a roupa esvoaçante de Gris que lhe concede novos poderes: durante a depressão ela consegue nadar livremente, por exemplo. Uma metáfora comum para quem está cercado pela tristeza profunda é o afogamento, um mergulho introspectivo e longe dos demais: o mundo parece estranho e distante.
Seja através de tempestades de areia que testam a perseverança ou pela ajuda de pequenos seres amigáveis em busca de maçãs, cada trecho de GRIS permite múltiplas interpretações sobre a trajetória da protagonista. Enquanto passeia por palácios em ruínas e a câmera se distancia cada vez mais da personagem, a insignificância de Gris contra o gigantesco mundo em ruínas é de tirar o fôlego.
Em termos de jogabilidade, o título não é desafiador. Alguns colecionáveis ficam escondidos, exigindo um olhar mais atento e trechos extra de plataforma, mas mesmo assim a dificuldade é mínima. A princípio, GRIS não é tão inventivo na plataforma, se aproximando mais de um walking simulator.
Entretanto, com o passar dos capítulos e os poderes que a protagonista adquire, os cenários e puzzles vão ganhando complexidade. A movimentação do jogo fica cada vez mais fluida, o que é favorecido pelas belas animações feitas à mão. Um dos meus momentos favoritos é quando o cenário se divide, e é necessário transitar por um mundo de ponta cabeça.
O encanto proporcionado por GRIS se deve também à trilha sonora, marcada por acordes de piano, rasgos de violino e vocais líricos. Além das excelentes músicas, a sonoplastia do jogo é deliciosa e merece que você use seus melhores fones de ouvido – ou, no meu caso, caixas de som da JBL, obrigando os vizinhos a apreciarem a beleza da trilha sonora.
De forma geral, o ritmo do jogo é lento, favorecendo a contemplação de sua estética minuciosa. Se por um lado é uma aventura casual o suficiente para ser aproveitada por quem não está acostumado com vídeo games, por outro pode se mostrar entediante para jogadores mais agitados. Se você não gosta de walking simulators, deve levar esse fator em consideração.
Entretanto, o fato é que GRIS traz uma história poderosa de superação, que consegue sensibilizar até os mais céticos através de sua arte irretocável. Todos nós já passamos por momentos difíceis, e a arte é uma ferramenta essencial para lembrarmos que não estamos sozinhos em nossos conflitos internos.
GRIS é universal em sua beleza e numa história que, sem utilizar palavras, fala para pessoas de todas as nacionalidades. Uma experiência memorável, que recomendo de coração.
GRIS está disponível para PC, através da Steam, e aos consoles Nintendo Switch e PlayStation 4.
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