Um homem solitário no espaço, acompanhado de uma inteligência artificial sarcástica e uma tuatara. O que poderia dar errado? Lançado pela desenvolvedora italiana GhostShark em novembro de 2019, Still There é uma aventura reflexiva disponível para PC e Nintendo Switch. Até o momento, os idiomas disponíveis são inglês, francês, italiano, alemão, russo e chinês simplificado.
Still There, antes de tudo, é uma aventura atmosférica. O início da jornada é um sonho que, apesar de simbólico, indica a tragédia pessoal do protagonista: a morte prematura de sua filha e a culpa que o astronauta carrega. O despertar ocorre no Bento, uma nave estacionária e a casa de Karl Hamba nos últimos dois anos.
Ao assumirmos o controle, é notável que os tutoriais foram desenhados com elegância, e não arrancam o jogador da experiência. Se é necessário clicar em algo, são os olhos sonolentos que focam no objeto; se Gorky (a inteligência artificial) vai indicar controles, é para sugerir sarcasticamente que o protagonista não seria inteligente o suficiente para fazê-lo. O que marca a experiência de Still There dos primeiros segundos aos últimos é o design polido.
Aliás, acordar na nave já é uma experiência por si só. Sua arte é meticulosa para indicar que ela é o lar de alguém, e a cada vez que você interage com um objeto, entende mais sobre a história de Karl, seus gostos pessoais e seu passado trágico. A narrativa não é linear: está espalhada em e-mails da caixa de entrada, um livro escrito pela metade, nos objetos pessoais de nosso anti-herói. O cuidado com os detalhes é imenso, e faz com que todas as dinâmicas sejam muito mais convincentes.
A verdade é que estou me afastando de mim mesmo. As pessoas dizem que quando você viaja pode ser uma pessoa diferente, mas isso não dura. O espaço é diferente. Você está verdadeiramente e essencialmente sozinho aqui fora. Remova qualquer presença de criaturas vivas ao seu redor e a auto-privação está completa: não há ninguém para notar você.
Depois de um tempo, você para de se notar também.
Trecho do diário de Karl
O título avança com tarefas diárias a serem cumpridas, que variam de refeições artificiais ao trabalho como operador de um farol flutuando pelo espaço. E é aí que entra a mecânica do jogo de puzzles técnicos. Basicamente, você tem um manual simplificado e uma série de alavancas e botões para configurar de acordo com o que sua empregadora está demandando. Seja estabelecendo conexões ou regulando os indicadores de oxigênio, os níveis começam levemente complicados e, com o passar dos dias, se tornam bastante complexos.
Entretanto, a desenvolvedora foi bastante consciente sobre essa questão, e por isso a cada puzzle difícil é oferecida a oportunidade de resolver uma versão facilitada, mas que não dá conquistas. Basicamente, o que essa opção simplificada faz é pular as configurações mais difíceis de deduzir, dando destaque para os elementos de point & click como achar um objeto ou testar combinações entre itens.
Quando você está se sentindo mais sob controle, logo a narrativa é abalada por estranhas instabilidades no Bento e um misterioso pedido de socorro. A partir daí, a rotina de Karl estremece, e ele se vê obrigado a repensar nas decisões que tomou durante sua vida e nas decisões que precisa tomar. O conflito que surge no jogo é intrigante, e cercado por reviravoltas cada vez mais radicais. De conflitos políticos a viagens temporais, todos os elementos que fazem uma boa ficção científica marcam presença.
Sou fã de jogos com puzzles, e posso afirmar com tranquilidade que Still There é difícil. Muitas vezes larguei o jogo depois de testar diversas combinações em um painel, para descobrir mais tarde que precisava ter mexido em outro primeiro. Como o compromisso do título é com a imersão, a mecânica gira em torno de vestir o traje espacial de cientista e compreender os manuais. É possível conversar com Gorky para ele dar algumas dicas, mas mesmo assim é exigida bastante lógica.
Todos os elementos funcionam bem em Still There. A narrativa mescla bem a dor da perda, o peso da solidão e um senso de humor mordaz, conduzindo o jogador habilmente através do universo construído. Fiquei diversas vezes ansiosa para entender o que estava acontecendo, apenas para descobrir que a resposta trazia mais perguntas perturbadoras. O protagonista é carismático, e ao mesmo tempo a arte do jogo conta sua própria história de memórias e desejos de um homem solitário, perdido e à espera de ser encontrado.
Ao mesmo tempo, os puzzles se encaixam perfeitamente na trama. Não parece que a história é uma desculpa para os puzzles, ou que os últimos foram feitos de qualquer jeito para conduzir os acontecimentos: Still There proporciona uma experiência equilibrada e reafirma a capacidade de desenvolvedoras pequenas nos presentearem com pérolas indie.
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