Com um financiamento bem-sucedido via Kickstarter, Wandersong foi lançado em setembro de 2018 por Greg Lobanov em parceria com a Humble Indie Bundle, e está disponível para Nintendo Switch, PlayStation 4 e Steam. Por enquanto, o único idioma disponível é o inglês.
Aqui, acompanhamos a jornada de um simpático bardo, que se vê em meio a uma aventura que pode decidir o futuro da humanidade. Desde o começo fica bem claro que ele não é bem um herói, já que sua visão otimista vai fazê-lo acreditar em milagres e finais felizes rejeitados por outro habitantes desse planeta apocalíptico. Ao lado de uma bruxa rabugenta, os dois correm contra o tempo e ao encontro de aventuras com piratas, monarcas, fantasmas, elfos, deuses e muitos outros personagens interessantes.
A jogabilidade não é desafiadora, mas se mostra criativa e divertida. Em meio a decadência de um planeta à beira do colapso é possível cantar (alterando o ambiente), dançar sem motivo aparente, lutar em momentos específicos e, principalmente, sair por aí conversando com personagens cheios de vida. Apesar de ter um design a princípio colorido e musical, mais tarde paletas escuras pontuarão agudamente os momentos tensos da trama.
As missões que movimentam a história envolvem normalmente puzzles simples, canções mágicas, conhecer novas pessoas e passear por um mundo catastrófico, e, mesmo assim, radiante. O jogo compensa a exploração com acontecimentos inusitados: é possível juntar um casal, saber todas as fofocas de uma vila de habitantes, entender melhor o passado de companheiros de viagem e daí em diante. Há tanto carisma em cada parte da jornada que buscar essas conversas alternativas é uma escolha natural e compensadora.
Os relacionamentos que vão surgindo no decorrer da trama são de uma escrita sensível e inteligente. O próprio bardo poderia ser um protagonista plano e sempre otimista, mas se mostra cheio de camadas: suas preocupações e visão de mundo eventualmente entram em conflito com a de outros personagens. Temas como existencialismo, luto, arrependimento e falta de propósito passeiam pela trama sem pretensões de grandeza. Não são tentativas de impressionar o jogador, e sim traços admiráveis de uma história absurdamente bem contada.
É difícil demonstrar esse tipo de grandeza sem entregar um pouco da história, então falarei de um pequeno spoiler a seguir (se quiser pular para o próximo parágrafo, fique à vontade). Filha fica órfã, e sonha em falar com a mãe novamente. As duas são músicas. Depois de uma série de acontecimentos, as duas se reencontram e, como despedida, tocam acordeão juntas. Essa é a última mensagem de uma mãe para a filha, e diz tanto que estou quase chorando (de novo) apenas de lembrar. Não há texto clichê, não há mensagens motivacionais, apenas a melancolia da perda e do amor intransponível para palavras.
A genialidade de Wandersong é essa: há um real senso de jornada. Desenvolvimento pessoal, obstáculos, sacrifícios, reencontros e conquistas, tudo se acumula para um efeito apoteótico ao final. Ao mesmo tempo que muito da história tem um senso de leveza, são apresentados conflitos humanos reais, com desdobramentos tocantes e que fogem completamente de dramas artificiais que podem rondar o gênero.
Talvez o título tenha momentos de jogabilidade desajeitados ou mesmo níveis em que é preciso realizar longas caminhadas, mas passear por esse mundo mágico e tão bem arquitetado dificilmente é uma tarefa desagradável. Há bastante foco na trajetória, então talvez para pessoas impacientes Wandersong seja um jogo mais difícil de ser apreciado. Mesmo assim, eu recomendaria a tentativa.
Sou uma pessoa bastante crítica em relação a estruturas narrativas, então afirmo com tranquilidade que trata-se de um título bastante acima da média. O senso de humor não perde para os momentos emocionantes, e chorei mais de uma vez no decorrer da trama. Existem livros, filmes e afins que não conseguem ter a mesma pluralidade e complexidade que Wandersong apresenta.
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